Modos de Enterramento
Tal como a
alma do falecido, também os restos mortais possuíam várias opções de destino
que dependiam, neste caso, da condição social da pessoa falecida como das
circunstâncias em que esta tivesse morrido. A maioria dos enterramentos eram
realizados “no interior das vivendas perto da casa ou dos celeiros, como no
centro “del solar” ou na parcela que conforma os conjuntos de espaços habitacionais.”
(ROQUET, p. 156) As fossas eram geralmente de forma alargada e profundidade
variável, com os extremos arredondados em algumas ocasiões e sem nenhum tipo de
tratamento. Segundo Roberto Garcia Moll: “(…) os mortos eram envoltos com petates
ou têxteis de acordo com a sua condição social em posição estendida e em geral
enterrados com os braços colocados ao lado do tórax ou entre cruzados. Noutras
ocasiões enterrava-se numa posição sentada.” (ROQUET, P. 156)
Do ritual
faz parte a preparação do cadáver, no qual era colocada uma pedra na boca, esta
de acordo com o estatuto da pessoa, podia ser de jade se a pessoa fosse
importante, ou obsidiana, se a pessoa era do povo. A pedra tinha como função
retribuir ao morto o seu coração que tinha sido previamente retirado,
garantindo a presença ou a vida da sua alma no trajecto ao seu novo destino. Em
certos casos era ainda colocada uma máscara funerária. Enquanto o defunto era
preparado e envolto em mantas e papel, era-lhe dedicado um discurso por um
ancião, sendo-lhe dito os locais onde este deveria passar na sua viagem ao
Mictlán, e oferendas. Entre as oferendas são encontrados “objectos pessoais,
tais como colares de contas, artefactos talhados em sílex e obsidiana, osso ou
chifre, adornos de conchas, vasos de tamanho pequeno e alguma figura de barro”
(ROQUET, p. 159), assim como cães que eram como que guias na perigosa viagem
que agora se iniciava. Eram ainda proporcionados ao morto alimentos para
garantir o seu sustento na passagem pelos diversos locais que conduziam a sua
alma ao “mais além”.
Estas
características estão relacionadas com enterramentos do tipo doméstico,
contudo, mesmo não tendo o caracter de uma “cerimónia ritual complexa, como
corresponderia um enterramento de caracter tributário ou dedicado a uma
divindade ou personagem importante, guardava contudo, em si mesmo, um sentido
de oblação ao considerar os restos mortuários como gérmen ou semente de uma
nova vida que ao ser depositado no terreno fértil da vivenda, garantiam a
procriação e com isto a permanência da linhagem” (ROQUET, p. 158)
O ritual de
cremação, também realizado, estava mais relacionada com a celebração de datas
significativas, como o fogo novo, ou em funerais de pessoas importantes. As
cinzas eram posteriormente colocadas num pote de barro que era enterrado.
A grande
variedade de tipos de enterramentos na Mesoamérica “responde a uma
diferenciação social mais do que a outros aspectos do desenvolvimento cultural,
as práticas funerárias dão-nos a possibilidade de conhecer o papel que teve a
morte no controlo do poder e o papel que desempenharam os membros da elite num
sistema político fortemente centralizado.” (ROQUET, p. 164)
Teotihuacan
Sendo uma
grande metrópole em Teotihuacan existiam diferentes maneiras de tratar os seus
mortos, o que resultou num complexo sistema mortuário, com vários tipo de
rituais e enterramentos, estes de vital importância. Teotihuacan pertence à
região do Altiplano Central, região na qual se verifica desde tempos remotos a
presença de enterramentos com oferendas.
Em
Teotihuacan predominava a inumação posição flexionada, geralmente sentados, e
virados para este, sendo que os enterramentos podiam ser em simples, ou
elaboradas fossas, tipo de enterramento predominante no âmbito das
características que já foram a cima referidas, ou em tumbas, no interior dos
altares e em urnas funerárias e que também se efectuava a cremação em alguns
sectores da cidade. Os enterramentos em fossa eram geralmente individuais,
existindo no entanto casos em que se depositavam dois ou três cadáveres, com
indícios de inumação simultânea.
Como
oferendas encontramos bonecas (que simbolizavam a ressurreição, com os membros
unidos ao tronco por um fio), vasos alaranjados que contiveram alimentos, assim
como facas, conchas (que representam o coração), o cão guia, e outros objectos
como braseiros. É de notar ainda que nem sempre se encontram os mesmo objectos,
sendo que tal como os rituais variam também os objectos presentes, podendo
encontrar-se uns e não outros, ou uns em maior quantidade e outros em menor.
Uma
característica própria da zona do altiplano central “é a presença de
enterramentos radiais de caracter propiciatório ao redor dos templos e
adoratórios. Estes enterramentos estão associados à ideia de sacrifícios de
crianças, que por sua vez está relacionado com os rituais de fertilidade.” (ROQUET,
p. 187) Contudo, estes enterramentos realizaram-se, não por um suposto costume
de sacrificar crianças, mas sim através do aproveitamento de corpos dos
recém-nascidos falecidos, vitimas da elevada taxa de mortalidade infantil.
Em
Teotihuacan, que se destaca nesta zona pelo seu caracter funerário, é
importante recordar a Pirâmide do Sol, grande adoratório, construído sobre um
sistema de cavernas. Estas, segundo as investigações de Doris Heyden,
constituem a origem do local e da construção do grande conjunto que conforma o
grande centro cerimonial. També de acordo com Heyden o sentido original do
local, que se tornou o centro religioso do mundo mesoamericano, o “local onde
se reúnem os deuses”, estaria relacionado com o significado das cavernas como
útero materno, no qual está presente um caracter dual do local como espaço de
morte e nascimento do ser.
O facto é
que no interior destas cavernas, se encontram “numerosos restos de crianças supostamente
sacrificadas ao deus da chuva num ritual de fertilidade, assim como de urnas
funerárias.” (ROQUET, p. 188) Isto, juntamente com a descoberta realizada pelo
arqueólogo Leopoldo Batres, na primeira década do século XX, que encontrou
restos de crianças nas extremidades de cada um dos constituintes que compõem as
plataformas sobrepostas da pirâmide, evidencia o caracter sepulcral que teve o
local desde a sua.
Em
Teotihuacan foram encontradas um elevado número de mascaras em pedra, sendo que
era utilizada a ónix, diorito e a serpentina, combinadas com conchas, corais e
obsidiana. Estas podiam ser colocadas sobre o rosto do morto ou no exterior do “bulto
mortuário”, aspecto padrão constante para toda a Mesoamérica, o que se percebe
se tivermos presente que Teotihuacan seria um importante centro religioso ao
qual se deslocavam populações de quase todas as regiões da Mesoamérica para a
celebração de grandes cerimónias religiosas e funerárias
Monte
Alban
A grande importância dada pelos
Zapotecas aos seus antepassados mais ilustres resultou numa grande produção
artística relacionada com os rituais funerários. Junto ao seu caracter
religioso e defensivo, o local apresenta uma grande importância funerário
devido à série de tumbas existentes, que ultrapassam as 190, e se localizam
tanto nas ladeiras da colina, na qual assenta o grande centro cerimonial, como
nos pátios centrais dos conjuntos habitacionais, situados ao pé das montanhas,
ou também dentro das habitações, no caso dos enterramentos mais simples.
Nos enterramentos mais simples, de
caracter doméstico, verifica-se a existência de pequenas oferendas, imagens de
divindades, assim como com os seus utensílios de trabalho, sendo um sacerdote
encarregado da cerimónia. No que toca às tumbas localizadas em templos e
palácios ou adoratórios, estas constituídas por antecâmara e camara
subterrâneas, edificadas à base de paredes de pedra com tectos segurados, numa
primeira etapa, por lajes planas apoiadas sobre os muros laterais, tal como
caixões, técnica que posteriormente mudaria para tectos angulares gerados a
partir do apoio de duas lápides que conformavam uma espécie de abóbada
triangular.
O complexo sistema de tumbas existente
destaca-se pelas suas dimensões, crendo-se que estas sepulturas pertenceriam a
personagens relevantes da comunidade. A elite era enterrada com as suas
melhores roupas, jóias e emblemas da sua linhagem. Um sacerdote estava também
encarregue destas cerimónias, sendo acompanhado dos seus parentes, pessoas em
luto e população. A oferenda era distribuída pela camara mortuária e
antecâmara, e consistia em vasos de argila para água e comida, assim como
espólio em ouro. As cerimónias durariam toda a noite, sendo por vezes
sacrificados escravos que se encarregariam de continuar a atender ao morto na
outra vida.
Nestas paredes encontram-se ricas
pinturas murais, frescos onde se denota a influência dos murais de Teotihuacan,
assim como nichos destinados a receber tanto oferendas como urnas funerárias,
anteriormente descritas. Estas, decoradas com esfinge dos seus deuses ou de
seres humanos sentados, eram colocadas nas camaras e antecâmaras como invocação
de protecção divina. Estas eram os objectos centrais da oferenda, juntamente
com os restantes utensílios, para que não faltasse protecção divina, alimento e
água. Para além de protecção as representações de divindades nestas peças
estavam destinados a acompanhar e a conduzir os mortos para protege-los tanto
na sua viagem ao inframundo como na sua vida eterna. Parecem também
representações de cenas da vida quotidiana e cerimónias rituais.
Relativamente às pinturas, também
muito características da arquitectura sepulcral da zona de Oaxaca, os murais
policromados eram conjugados com relevos igualmente abundantes. Nestes
destacam-se os personagens representados no interior da tumba que estavam
direccionadas à entrada numa atitude simbólica de vigilância ou assinalamento
do ponto através qual se acede ao espaço sacralizado.
A importância funerária de Monte Alban
difundiu-se mundialmente após a descoberta da tumba número 7, por Afonso Caso
em 1932, e no interior da qual se encontrava um rico tesouro constituído por
numerosas contas de ouro, jade, braceletes de ouro e prata, um crânio decorado
com um mosaico de turquesas, assim como peças de turquesa que pertenceria a
mosaicos que decorariam as paredes. Foram também encontradas máscaras de ouro,
jade, obsidiana, âmbar, e mais de três mil perolas, entre outras peças. Contudo
Afonso Caso não descobriu apenas um rico tesouro, mas sim uma evidência da
evolução histórica do local. Ora este concluiu que a tumba teria sido
originalmente construída pelos Zapotecas, sendo posteriormente preenchida para
a construção de um templo sobre a mesma, cujo peso resultou no seu
derrubamento, sendo posteriormente reutilizada pelos Mixtecas, acumulando assim
a tumba numero 7 uma enorme acervo cultural Zapoteca e Mixteca.
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